Seja para decidir sobre a fusão de empresas ou a nova estratégia de Marketing, ou mesmo sobre a sua mudança de emprego, é importante pensar bem e refletir o suficiente em cima das alternativas; acontece que, nem sempre, o fazemos. Esses são apenas alguns exemplos de decisões importantes e com consequências relevantes na vida da Organização, ou mesmo na sua própria vida. Nesse artigo vamos falar sobre como pensar melhor antes de tomar decisões.
É importante deixar claro que existem situações em que, embora tenhamos refletido bastante, acabamos tomando decisões equivocadas; assim como existem situações em que, com pouca (ou nenhuma) reflexão, tomamos decisões que acabam se mostrando acertadas. A possibilidade de erro em decisões sempre irá existir, o que devemos buscar é, na medida do possível, reduzir essa possibilidade de erro.
Pensar Rápido e Devagar
No seu best-seller Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar, publicado em 2011, Daniel Kahneman (Prêmio Nobel de Economia de 2002) explica que temos duas formas de pensar e tomar decisões: a rápida e a devagar. A rápida (sistema 1) ele diz que é aquela “automática”, cuja resposta nos vem automaticamente, sem pensar, intuitivamente, baseado em emoções e impressões. A Devagar (sistema 2) é aquela que nos exige parar e pensar, usar a memória ou o raciocínio consciente, estar concentrado e manter a atenção. Ele dá o seguinte exemplo: as perguntas sobre quanto é 2 + 2 será respondida pelo seu sistema 1, enquanto que a resposta de quanto é 17 x 24 será respondida pelo seu sistema 2. Kahneman diz que, enquanto nosso sistema 1 funciona automaticamente, o sistema 2 permanece em modo de espera, com pouco esforço. Quando tudo funciona, o sistema 1 fornece continuamente informações ao sistema 2, e este adota essas escolhas com pouca ou nenhuma modificação. Porém, quando o sistema 1 não fornece uma resposta (como no caso da multiplicação de 17 x 24), o sistema 2 é mobilizado. Kahneman diz que o erro pode aparecer quando você deveria utilizar o sistema 2, mas utiliza apenas o sistema 1. A compreensão de que existem essas duas formas de pensar pode nos ajudar na tomada de decisões, sejam elas profissionais ou pessoais.
Pensar 2 Vezes
No livro Think Twice: Harnessing the Power of Counterintuition (Pense Duas Vezes: Aproveitando o Poder da Contraintuição – em tradução livre), de Michael J. Mauboussin, publicado em 2009, o autor diz que ninguém, intencionalmente, toma más decisões, porém, as tomamos com frequência. Por exemplo, alguns dos piores desastres da história recente, como o colapso dos principais bancos de investimento, foram o resultado de decisões aparentemente razoáveis, tomadas por muitas pessoas inteligentes. Michael Mauboussin argumenta que isso ocorre porque o processo correto para decidir bem, especialmente quando os riscos são altos, entra em conflito com a forma como nossas mentes funcionam naturalmente. Quando somos confrontados com situações complexas, nosso cérebro tenta reverter para padrões simplificados que acabam obscurecendo abordagens que seriam melhores para o problema; e mesmo quando pensamos que estamos aplicando lógica e razão, podemos estar, subconscientemente, sucumbindo a influências sociais ou situacionais. Mauboussim diz que podemos melhorar a nossa tomada de decisão aprendendo a “pensar duas vezes”, elencando uma série de recomendações:
- Ter uma Visão de Fora: nas mais variadas situações, devemos ter em mente que, muito provavelmente, outros podem ter enfrentado o mesmo problema, de modo que nós podemos aprender com os resultados de outras decisões semelhantes. Os erros geralmente acontecem porque confiamos demais em nossas habilidades, acreditando que estamos acima da média (ilusão de superioridade), e também porque tendemos a ser otimistas demais (viés otimista). Outro problema está relacionado ao fato de não consideramos devidamente possíveis eventos aleatórios não sujeitos ao nosso controle.
- Ter uma Visão Ampla: em geral, nós não consideramos opções alternativas suficientes porque nossa mente tende a usar modelos que simplificam demais as situações, e os vieses mais conhecidos são a ancoragem (referência inicial), e a disponibilidade (considerar mais provável o evento mais mencionado). Para evitar os erros, considere explicitamente alternativas, busque discordar, e evite tomar decisões quando estiver sob forte emoção. Evite o Viés da Retrospectiva (Hindsight Bias), que refere-se à tendência das pessoas perceberem eventos que já ocorreram como sendo mais previsíveis do que realmente eram antes de ocorrerem.
- Analisar Criticamente a Opinião de Especialistas: pelo fato de termos, em geral, uma confiança acrítica nos especialistas, Mauboussin lembra que as habilidades de previsão dos especialistas em todos os campos não são tão boas em prever o futuro quando a incerteza está envolvida, dizendo que a “sabedoria das multidões” é mais confiável (em referência ao pensamento de James Surowiecki, que defende a ideia de que grandes grupos de pessoas são mais espertos do que uma elite de poucos – não importa quão brilhantes – sendo melhores na solução de problemas, na promoção da inovação, na tomada de decisões sábias e até na previsão do futuro). As soluções apontadas incluem a busca pela diversidade de opiniões e o uso da tecnologia, sempre que possível, para a tomada de decisões.
- Cuidar com o Efeito Situacional: muitas vezes não nos damos conta do quanto somos influenciados pelos outros e por nossos próprios sentimentos. Mauboussin narra um interessante experimento de venda de vinhos franceses e alemães em uma loja: quando a música francesa era tocada, 77% das vendas eram vinhos franceses; mas quando a música alemã era tocada, 73% das vendas eram vinhos alemães; no entanto, 86% dos compradores negaram ter sido influenciados pela música. Mauboussin cita, também, o famoso experimento da Prisão de Stanford, que foi realizado na Universidade de Stanford por um grupo de pesquisa liderado pelo professor Philip Zimbardo, usando estudantes universitários que aceitaram participar. Os estudantes rapidamente adotaram seus papéis designados, com alguns “guardas” aplicando medidas autoritárias e excessivas (indo além do que era permitido pelas regras do experimento), e submetendo alguns “prisioneiros” à tortura psicológica, enquanto muitos presos aceitaram passivamente o abuso psicológico naquela situação. O prof. Zimbardo conclui dizendo que o que somos é moldado tanto pelos sistemas que governam nossas vidas (riqueza e pobreza, geografia e clima, época histórica, domínio cultural, político e religioso), quanto pelas situações específicas com as quais lidamos diariamente.
- Atentar aos Sistemas Complexos: O raciocínio de causa e efeito pode falhar quando os sistemas são complexos porque o todo é maior que a soma das partes. Focar o motivo pelo qual os indivíduos em um sistema fazem algo pode não ajudar a explicar como o sistema inteiro funciona. Entenda as regras que governam todo o sistema e não as regras que orientam os participantes individuais. O autor cita o conceito de Inteligência de Enxame, que é o comportamento coletivo em sistemas descentralizados e auto-organizados (a expressão foi introduzida por Gerardo Beni e Jing Wang, em 1989, no contexto de sistemas robóticos celulares). Mauboussin diz ainda que a irracionalidade do mercado não decorre da irracionalidade individual, e que alterações em um componente do sistema afetam o todo. Recomenda usar simulações para construir sistemas complexos.
- Considerar que Correlação não Implica em Causalidade: Mauboussin explica que a ocorrência concomitante de dois eventos não implica, necessariamente, em que um seja a causa do outro. Por exemplo, se no mês mais quente do verão o quiosque de sorvete vendeu mais, e o de água de coco também, não quer dizer que um seja a causa do outro, pois a causa de ambos é o calor. Ou seja, para haver causalidade, a variável “x” deve ser função de “y”, e não deve haver “z” que cause “x” e “y”.
- Esteja Preparado para os Momentos Ah-Whoom: Se você colocar uma bandeja de água no freezer, a temperatura da água cai gradualmente até o ponto de congelamento. A água permanece líquida até que – ah-whoom! – vira gelo. Mauboussin explica as transições de fase, nas quais pequenas mudanças incrementais levam a efeitos em larga escala. Considere os valores extremos em uma distribuição, atentando para os Cisnes Negros (como descrito por Nassim Taleb, no livro de mesmo nome), pois, em geral, consideramos eventos altamente improváveis como impossíveis de ocorrer.
- Não Contar com a Sorte: Embora devamos ser sempre positivos e torcer para que o melhor aconteça, estruturar nossas decisões contando com a sorte é algo extremamente temerário. Mauboussin diz que qualquer sistema que combine habilidade e sorte reverterá para a média ao longo do tempo, pois, não considerar isso faz as pessoas pensarem que são especiais e que as regras de probabilidade não se aplicam a elas. Isso é reforçado pelo Efeito Halo que é a tendência em avaliar positivamente determinada característica, baseada em uma impressão positiva de outra característica não relacionada.
Três Critérios Práticos
No meu livro 52 Bons Hábitos de Gestão, Liderança e Relações Humanas, eu recomendo, ao tomar uma decisão, considerar 3 critérios básicos:
- Princípios Morais: pense se a decisão está em linha com os princípios morais (boa fé);
- Justiça: analise se a decisão é justa;
- Maior Benefício: veja se o resultado proporcionará o melhor benefício possível para o coletivo, para a Organização, para o time como um todo;
Portanto, antes de tomar decisões importantes, ou que envolvam alto risco, pense melhor, pense duas vezes!